"O universo parece brincar de desencaixar, enquanto a vida só sabe obedecer."

outubro 28, 2014

Uma estrela na porta

       Um dia uma estrela desprendeu-se de onde estava. Muitos outros dias várias outras estrelas desprenderam-se também, mas desprenderam-se do Céu. E por amor. Nesse dia, uma estrela apenas desprendeu-se de como estava, mas continuava a estar no céu. 
          A estrela desprendeu-se do tempo. 
          O Céu se surpreendeu. 
        Todos os dias que o Céu sentiu em si o mover de uma estrela, foi para vê-la se aventurar pelo seio do universo procurando em outros seres o amor que já estava em si. Mas o Céu sempre soube que, apesar do amor estar perfeito dentro de quem ama, o amante só o descobre quando sai do lugar. Os vários dias que as estrelas saíram do Céu, foi por outro alguém.
          Um dia uma estrela saiu da compreensão do Céu.
          Como um véu que cobre a surpresa de um bem-querer, a estrela moveu-se no Céu se revestindo de ar. Dançou por entre os outros corpos celestes e bailou no tempo. Cobriu com o seu brilho a obviedade dos seus passos. Como um véu alvo e transparente, a beleza do amor se descobriu pro Céu.           O desprendimento da estrela foi pra brincar com o tempo. A estrela conheceu o amor quando ainda estava parada no seu lugar. A estrela amava a si. A estrela amava o Céu. A estrela amava amar. Ter descoberto o amor assim sem precisar sair do lugar teria surpreendido a sabedoria do Céu, mas o Céu só soube da descoberta quando a estrela saiu.
           Ainda assim o Céu se surpreendeu.
          Um dia uma estrela encontrou o amor perfeito em si. A estrela que surpreendeu o Céu por ter se desprendido, não para uma aventura em outros seres, não para os sedutores campos desconhecidos, mas para fazer daquele dia uma eternidade. Surpreendeu o Céu porque aceitou sair do seu lugar pra transpassar o próprio tempo.
           Um dia uma estrela desprendeu-se para girar por aí só pra fazer com que esse "um dia" nunca acabasse. 

abril 24, 2014

O dia em que a Lua brilhou

            E foi a pequena estrela atravessar o seio do Céu em busca de sentir em si a leveza de conquistar um espaço em outro alguém. E foi a estrela colonizar o amor na nobre Lua que tanto a encantara. E a estrela chegou lá. Mas as paixões são sentimentos de via de mão única, e a pequena estrela que tanto quis enraizar amor descobriu que estava apaixonada.
            A Lua sorriu. O saber que se é amada invadiu todo o seu corpo e a fez querer rir pra vida. Mas logo a Lua se preocupou. Toda a aventura que a pequena estrela se envolvera pra um simples estar perto envaidece qualquer corpo, mas a lealdade da Lua sabia que a paixão que a estrela irradiava precisava saber que a própria Lua já havia entregado seu amor a outrem.
            A pequena estrela compreendeu. De longe, muito longe, a estrela se imaginou amando. De todos os sabores que o Céu lhe ensinou, de todos os amores que as outras estrelas lhe contaram, de todos eles a estrela ajuntou um pouquinho. A pequena estrela, de longe, procurou um alguém que traduzisse o amor que queria sentir. E foi na Lua que a estrela se viu.
            A Lua, de longe pouco longe, dedicava sua vida a admirar a quem amava. Do mais puro amor que a estrela procurou encontrar, a Lua demonstrava, todas as noites e dias, sentir pela nobre Terra que estava logo ali. A paixão que movia a pequena estrela pareceu se desabrochar em puro amor. Não houve ciúmes, nem inveja. Tudo o que a pequena estrela sempre quis era ter em si a nobreza de um amor, e foi na Lua que ela encontrou.
            Bem lá no Céu um brilho surgiu. Estrelas são seres especiais. Não há no universo alguém que seja mais intenso que uma estrela. E com toda a intensidade do mais nobre sentimento que pode existir, uma pequena estrela se entregou à Lua. O amor não se trata de querer para si o amado. O amor trata de querer o outro feliz. A pequena estrela se desfez em luz e cobriu a Lua de brilho.
            Logo ali a Terra sorriu encantada.  Até hoje Lua e Terra bailam juntas colorindo o Céu. 

abril 08, 2014

II

               Uma estrela cadente atravessando o Céu pra realizar um desejo. Vários sereszinhos na Terra fazendo pedidos crendo que a estrela os realizaria. Mas não. Não importa o quão distantes e diferentes sejam os moradores do universo, não importa o quão experientes e perpétuos sejam, sempre haverá de se saber que o universo tem um centro, e o centro está em quem . E seja como for o ser a pensar, ele precisa descobrir que apesar do tal universo necessariamente precisar de um centro, que está exatamente em quem está pensando no tal universo, não há centro que seja significante pro universo dos outros. 
               Mas pode haver. 
           Uma estrela cadente atravessou o Céu pra realizar um desejo. Paixões dão o empurrão que qualquer um precisa pra sair do lugar. Com a estrela foi assim. Saiu do seu lugar pra alcançar a si mesma em um outro alguém. Não há paixão mais empurradora que do amor. E não há, também, paixão mais corruptível que do amor. 


dezembro 23, 2013

O dia que uma estrela se apaixonou pela Lua

" Perdoa-me, Sol. Perdoa-me, Céu."

             Nenhuma estrela jamais pensou em se apaixonar. Nenhuma estrela jamais pensou em alma gêmea. Mas estrelas e estrelas já caíram de amores. E ainda caem. As paixões são assim, simplesmente vêm. Nenhuma estrela procurou suas paixões. Mas paixões são assim: simplesmente vêm.
             Um dia uma estrela se imaginou, e se imaginar é um fortuito porque estrelas sabem como são. São estrelas, são irmãs, são partes do Céu. Estrelas não precisam pensar em como são.Mas um dia houve uma estrela que se viu diferente das demais. Se imaginou só e se sentiu só. Não é bom que ninguém se sinta só. E foi nesse dia que uma paixão veio. Ninguém está só até que encontra o amor. A solidão aparece quando a gente se dá conta que não se está completo, justamente, porque uma parte de nós foi descoberta em outro alguém. Nesse dia a estrela descobriu-se bem além de si. Nesse dia a estrela descobriu-se na Lua. 
              Ai, o amor!

novembro 15, 2013

Declaração de uma estrela

              Eu estou aqui. E pra ser sincera, ou menos incerta, deveria dizer eu estamos aqui. Não que aqui seja um lugar. Não que com lugar eu esteja falando de espaço. Não, eu definitivamente não sei onde estou no espaço. Mas estou aqui. Ou melhor, estamos aqui. E claro que a confusão da minha fala não era sobre o aqui. A bem da verdade é que eu não estou só. Quer dizer, não há só um dentro desse eu.
             Eu estamos aqui. Não vou assumir um nós porque eu estou apenas falando de mim.
             Aqui dentro de mim parece haver uma colônia.
             Um dia eu quis sair do meu estado eterno. Eu não fazia ideia de que poderia existir um eu. Lá no seio do Céu não havia em mim ou em minhas irmãs algo que nos separasse. Éramos simplesmente nós. Curiosamente simples. Mas um dia a aventura ficou irresistível. Um dia eu quis sair. Um dia eu virei eu. E eu saí. Assim, no singular.
             Cá estamos aqui. Do seio do Céu eu saí. E de lá pra cá só me encantei. Mas parece que cada encanto ocupava um canto dentro de mim. E, mais, parece que não havia cantos suficientes. E foi aí que dentro de mim nasceu mais eu.
             Talvez seja uma regra. Talvez não. Viver em movimento talvez signifique criar mais aquis  do que um simples eu pode suportar. Talvez não. Mas, cá onde estamos agora, eu não sei o que achar. Há tantos dentro do eu que parece que nunca haverá um equilíbrio pra eu saber como reagir. 
             Um dia eu saí do meu estado que até então era eterno. Um dia eu passei a ser mais que um. E uma coisa que eu e eu jamais duvidamos é que coincidências não são obra do acaso. Coincidências são cuidadosamente calculadas. Agora que eu estamos cá num estado de conflito, vou esperar que essa parcela do tempo de agora chegue logo no tempo produto.
             Eu estamos aqui. Logo estaremos lá. Onde quer que esteja lá.